Saciava sua fome com um biscoito de pacote que carregava na mochila enquanto ainda estava esperando um ônibus, mas não demorou muito para que ele chegasse. Entrou desordenado, colocou o dinheiro separado do bolso na mão do trocador que tinha um olhar cansando, sem importância. Olhou em seguida para as pessoas, pareciam ter suas vidas esmagadas por um peso tão cruel que o mesmo, por pura maldade, deixou-as vivas. O único banco vazio se encontrava no final do ônibus, onde uma senhora estava sentada ao lado. Sumiu do mundo enquanto o ônibus andava, imaginava reencontros, um chegada rápida e uma volta acompanhada, imaginava sua casa com mais um integrante, imaginava sua vida transformada, imaginava sempre o melhor, o positivo. Ninguém tinha lhe contado a verdade sobre a crueldade do mundo. Na verdade já tinham falado de histórias, cuidados e atenções que deveria tomar, mas para ele eram apenas os vilões de sempre que poderiam ser derrotados com um herói qualquer, podia ter quinze anos, mas sua inocência era tão pura que seu rosto só liberava dez anos de vida.
Percebeu a senhora, a que estava ao seu lado, era a única ali que parecia estar sorrindo constantemente sem precisa de motivo ou, pelo menos, nenhum motivo que ali se encontrava.
- Com licença, você conhece a cidade de Arabutã?
- Arabutã filho? Não conheço não... Onde fica?
- Não sei, queria saber, preciso ir pra lá.
- Desculpe filho, não sei.
- Obrigado mesmo assim.
Voltaram os dois aos seus estados anteriores, mas a conversa foi retomada não durou muito tempo.
- Você sabe onde fica a rodoviária?
- Sim, eu estou indo para lá, vou te levar, tudo bem?
- Sim! - Teve um motivo a mais para sorrir, aparentemente estava tudo dando certo - Muito Obrigado senhora.
Seu estilo simples de falar comoveu o menino, era uma pessoa tão doce em suas palavras, sua expressão e no seu olhar.
- Vou voltar para meu marido em Minas Gerais, vinte anos que não o vejo.
Enfim, estava explicada a sua felicidade constante e sua esperança comovia o menino.
- Que bom! Eu também vou encontrar uma pessoa em Arabutã.
- Parece ser uma pessoa muito importante para você, está muito entusiasmado. - A conversa animada não parou.
- Estou sim! Não espero a hora de chegar até essa cidade!
- Guarde a euforia para o reencontro!
Os dois ficaram conversando sobre tudo o que poderiam imaginar, sobre os desejos, sonhos, habilidades e a vida.
Chegaram então à rodoviária, aonde saltaram e andaram até sua entrada principal.
- Aqui estamos, amiguinho.
- Obrigado e boa sorte!
- Mas onde está sua mãe?
- Não, não, vou ver minha irmã.
- Onde ela está?
- Em Arabutã.
- Com quem você vai? Sua mãe, seu pai?
- Ninguém.
Ela ficou em estado de pânico, sem saber o que fazer, sem saber o que falar.
- Como pretende chegar a essa cidade, amiguinho?
- Vou pegar um ônibus, não tem outro jeito. Preciso ver minha irmã, ela não pode ficar sem mim!
Estava começando a ficar desesperado ao perceber o olhar estatelado da mulher.
- Não! Seus pais sabem?
- Eu não tenho pais. Só temos eu e minha irmã.
Suas palavras foram frias e sem coração o que deixaria qualquer um triste.
- Você não me falou isso! Como irei te ajudar?
- Não precisa se preocupar, seu marido te aguarda.
- Deixe eu te levar até lá! Vamos comigo!
- Não se preocupe, eu pego um ônibus qualquer que vá para Arabutã.
- Deixe que eu te leve, vamos comigo até Caxambu, eu e meu marido te levamos até sua irmã.
Um desvio na sua viagem poderia ser a queda, poderia dar tudo errado, mas ele não sabia para onde estava indo, poderia se perder, poderia não chegar lá, talvez com a ajuda de uma pessoa mais velha ele conseguisse. Tudo isso passou tão rápido por sua cabeça que a resposta foi na mesma velocidade.
- Tudo bem.